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Medo de ficar sem celular? É bem provável que você tenha nomofobia

Tairine Ceuta, jornalista e influencer, tem dois celulares (Foto: Divulgação)

A estudante de enfermagem Sarah Barreto aceitou um desafio bem complicado. Não se trata de mergulhar numa piscina com piranhas, tampouco pular de paraquedas. Pior: passar a maior parte do dia sem seu celular. Foram duas horas de abstinência, teoricamente. “Aceitei, mas comi alguma coisa e fui dormir. Não dá para me manter acordada sem meu celular. Desculpe, mas não consigo”, disse Sarah, de 22 anos. Ainda descobrimos que ela fez publicações no Instagram durante este tempo.

Atualmente, olhar constantemente o celular é mais comum do que abrir a geladeira o tempo todo sem saber o que procurar. Se, assim como Sarah, você também não consegue ficar mais de 10 minutos sem mexer no celular, é bem possível que seu caso esteja englobado na mais nova fobia da era digital: a nomofobia.

Este medo é tão novo que nem utiliza mais o latim. Nomofobia vem do inglês “no mobile”, sem celular, literalmente. É o pavor de ficar incomunicável sem seu aparelho. Pode parecer algo normal para um mundo em que o smartphone se tornou a extensão do cérebro, né? Contudo, se não tratada, esta fobia se transforma em algo pior, como dependência, ansiedade crônica e até depressão. Os sintomas parecem bem comuns no nosso cotidiano: o tempo todo olhando notificações, preocupado quando a bateria vai acabar, não consegue se reunir com amigos sem olhar o celular, interrompe afazeres para mexer no aparelho e entra em pânico quando fica sem internet. 

“Não sei se fico mais de cinco minutos sem o contato com meu celular. Se for para ficar o dia inteiro, eu infarto. Só mesmo quando durmo ou estudo. Uma vez meu celular não queria ligar, tive uma crise de ansiedade, com medo de ficar sem me comunicar, ficar sem meu celular. É meu companheiro, está ao meu lado o tempo todo”, confessa Sarah, que resolveu procurar ajuda psicológica para conter mais a ansiedade, principalmente neste período de pandemia, em que se intensificou mais o uso do aparelho. Ela chega a interromper uma aula de boxe para olhar o celular. Para se ter uma ideia, uma pesquisa feita pela consultoria inglesa Tecmark, um cidadão pega, em média, 221 vezes no celular, por dia. Toques na tela chegam a 2.600 todos os dias. E estamos falando de um estudo realizado em 2019, portanto, antes da pandemia. 

Sarah tentou ficar o máximo de tempo possível sem o celular. Conseguiu duas horas: “porque dormi” (Foto: Acervo Pessoal)

Imagine que o celular se tornou uma plataforma de lazer, comunicação e compras neste período de isolamento. Quase impossível não se apegar. Segundo uma pesquisa da plataforma AppAnnie, o brasileiro ficou uma média de  5,4 horas por dia com o olho na tela, o maior tempo, pelo segundo ano seguido, em todo o mundo. O aplicativo mais utilizado foi o Whatsapp. No ano passado, somamos uma média de 29,2 horas, por mês, somente no app de conversa. Os números podem ser ainda maiores, já que a pesquisa contabilizou apenas aparelhos androids. Quem usa Iphone ficou de fora. 

Foi o caso do capitão do Exército, Eduardo José, que utiliza um Iphone, mas admite não conseguir ficar muito tempo sem seu celular. O militar mostrou seus dados de celular no dia da entrevista, entre 6 horas, seu despertar, até meio-dia, hora da entrevista. Neste período, foram 3h32 minutos mexendo no celular. Mais da metade de seu tempo foi no aparelho. Cerca de 50 minutos foi assistindo uma aula de especialização. “Não tem como negar a dependência e um pouco de ansiedade também quando fica sem o aparelho. Mas é muito difícil voltarmos ao padrão do celular só com a cobrinha [o jogo], pois os smartphones modernos são sedutores e aprisionadores com a comodidade e ampla acessibilidade. Nele eu vejo aula, pesquiso, assisto filmes, olho resultados esportivos, tudo. Estou tentando diminuir essa relação, realizando atividades incompatíveis com o celular, como exercícios ao ar livre. O problema é que fico sem ouvir música, né”, indaga o capitão. 

Para a psicóloga Mirian Conrado, não podemos culpar as novas tecnologias, que são benéficas quando são utilizadas de forma controlada, principalmente neste momento de pandemia. “não podemos deixar de sinalizar que o uso da tecnologia já está incorporado à interatividade da sociedade contemporânea. É importante ressaltar que o problema não é, necessariamente, a tecnologia em si, mas o uso que fazemos dela”, disse a psicóloga. 

A influencer Tairine Ceuta é um bom exemplo de como é difícil se livrar do celular, principalmente quando nosso pão de cada dia vem dele também. O trabalho dela depende do smartphone, mas a também jornalista conseguiu diminuir seu tempo no celular com uma solução curiosa: ela resolveu ter outro celular. Um para o trabalho e diversão, que é desligado nos finais de semana. O outro, restrito, apenas seus familiares possuem o número. “Eu já acordo pegando o celular para dar bom dia. Faz parte do trabalho publicitário. O celular paga minhas contas e desligá-lo é como pedir demissão de um trabalho. Não dá. Eu também sou fofoqueira, gosto de ver a vida dos outros nas redes sociais. Uma vez que passei o dia sem pegar no celular e o povo achou que tinha sido sequestrada”, lembra Tairine.

Um belo dia, Tairine fez uma gravação televisiva com diversas receitas e acabou não pegando o celular durante o dia inteiro. “Neste dia, minha amiga recebeu uma mensagem de um suposto sequestrador, dizendo que tinha me sequestrado. Ela olhou minhas redes, nenhuma postagem. Me ligou, mandou mensagem, nada. Pronto, foi um desespero. Não queria ligar para minha mãe, com medo de colocar todo mundo em pânico. Pediram R$ 5 mil reais de resgate. Só 5 mil? Poxa, sacanagem! Mas conseguimos nos falar antes do resgate”, brinca. 

Para o psiquiatra e coordenador do pilar de psiquiatria da Medicina UniFTC, Lucas Alves, é difícil imaginar a sociedade atual offline. E o tempo no celular é muito relativo. Depende muito mais do que você faz com ele e se está prejudicando outros aspectos de sua vida.

“Esta relação próxima com o celular é algo da vida moderna. Esta nova fobia não diz respeito ao uso em número de horas, desde que seja contextualizado. O grande limite é quando existe o prejuízo na vida pessoal e social do indivíduo. Para sua saúde. Nas crianças, por exemplo, é preciso observar se está atrapalhando na sua socialização ou desempenho escolar”, disse Lucas.

Quando o prejuízo pessoal acontece, é hora de procurar ajuda de um especialista, que pode ser tratado com terapia ou até mesmo com medicamentos.

Lucas Alves inclusive prefere enxergar o celular como aliado, desde que seja usado de forma saudável. “Viver offline tem sido impossível, né? A vida online ajudou inclusive na superação da pandemia: reuniões, vídeos online, dispensa de deslocamentos. Este mundo [virtual] mostrou que pode ser útil. Como qualquer questão, o uso exagerado pode ser danoso. É uma avaliação contínua”, completa. É como em qualquer propaganda de cerveja: use com moderação.

Fonte: Agência Brasil

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