O dia de hoje, 25 de Julho, é tão ou mais importante para mulheres negras do que o 8 de Março, quando é comemorado o Dia Internacional da Mulher. Isso porque há 30 anos, mulheres negras de todo o Caribe e América Latina se reuniram na República Dominicana para discutir suas agendas, pautas, trocar informações sobre suas próprias vivências e pensar em ações de combate ao racismo e machismo que atravessam suas vidas.
Várias mulheres baianas estavam presentes naquela mobilização que aconteceu há exatas 3 décadas. Casos de Valdecir Nascimento, Cristina Rodrigues, Cátia Melo e Dora Dias. Criadora do Instituto Odara, Valdecir Nascimento coordena a Rede de Mulheres que nasceu ali. Há 10 anos, o Instituto organiza o Julho das Pretas, que, nesta edição, conta com 427 atividades realizadas por mais de 200 organizações de mulheres negras em 18 estados brasileiros, além de uma atividade em Paris.
Coordenadora do programa de Comunicação do Instituto, Alane Reis explica que a data é importante para mulheres negras, mais até do que o 8 de Julho, por lhes dar protagonismo. Nessa oportunidade, elas se unem para denunciar as condições do racismo, violência e machismo que atravessam suas vidas. Além disso, também é um momento de celebração própria, valorização de suas origens e atividades.
“Esse encontro aconteceu em 1992 porque estavam fazendo 500 anos de invasão do continente pelos colonizadores europeus, o que demarca o início do genocídio, exploração e escravização de povos nativos, indígenas e originários do continente americano, além da escravização, tráfico e exploração dos povos africanos e seus descendentes. A República Dominicana foi o primeiro país da América a ser invadido por colonizadores e por isso foi eleito para sediar o evento”, explica Alane.
Dayse Sacramento, pesquisadora criou Os Diálogos Insubmissos das Mulheres Negras (Foto: Luma Femiani/Divulgação) |
Coordenadora executiva do Odara, Naiara Leite afirma que os movimentos feministas, de mulheres como um todo, não dão conta de falar especificamente das vivências e experiências das mulheres negras. “Falar de mulheres no 8 de Março não dá conta da representação política e da grande agenda e vozes de mulheres negras no Brasil. Existe no 25 de julho um debate importante em torno da centralidade de pensar mulheres a partir do combate ao racismo. O racismo é uma violência que afeta a vida de mulheres negras e essa data tem um papel que atravessa um debate sobre apenas ser mulher”, detalha Naiara.
Na esteira desse encontro, em 2013, o Instituto Odara criou o Julho das Pretas para ampliar as possibilidades de atividades relacionadas ao Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha.
A ideia do Julho das Pretas é unificar uma agenda comum entre diversas organizações e grupos de mulheres negras para fortalecê-los. No primeiro ano, foram 17 atividades na Bahia, que foram crescendo. Nesta, que é a 10ª edição e marca o retorno às atividades presenciais, foram 425 atividades confirmadas em 18 estados.
“Ao longo dessas 10 edições, as atividades, sempre diversas que dialogam com o contexto que a Bahia, Brasil e Nordeste vivem, e implicam a vida de mulheres negras de um modo geral. Nessa perspectiva, a gente faz ocupações, seminários, debates, música, poesia, ocupações que, de maneira organizada, chamam atenção para a vida de mulheres negras e os desafios de direitos humanos vivos”, explicou Naiara.
A maior dessas atividades é a Marcha das Mulheres Negras. Em Salvador, a manifestação começa na Praça da Piedade e sai em direção ao Pelourinho, onde um festival de atividades culturais acontece até o final da noite desta segunda-feira (25).
No Brasil, a data ainda homenageia a líder quilombola Tereza de Benguela, um símbolo do movimento negro. Ter esse tipo de marco é importante para mulheres de todas as idades: desde Valdecir Nascimento com seus mais de 40 anos de militância até novas gerações como Lis Dórea, de 5 anos, modelo mirim.
Lis, de 5 anos, modelo mirim já aprende sobre o empoderamento das pretas desde pequenininha (Foto: Thiago Rosarii/Divulgação) |
Crescer conhecendo sua identidade e sem vergonha de ser uma menina negra, faz parte da luta e conquista das mulheres negras que vêm alcançando diversos espaços ao longo dos últimos anos.
“Acredito que o empoderamento das meninas negras é de suma importância para o desenvolvimento de uma vida mais digna, sem preconceitos e por uma igualdade racial e de gênero”, afirma Zuleide, a mãe de Lis.
Uma outra atividade cultural que já virou marco na esteira do Julho das Pretas é o Diálogos Insubmissos de Mulheres Negras, iniciativa da professora e pesquisadora Dayse Sacramento que que desde 2017 produz eventos literários de mulheres negras, com participação em feiras nacionais e internacionais, com o objetivo de promover debates e atividades que têm como mote a produção literária feminina negra, que dialogam com outras linguagens artísticas-culturais e políticas-sociais.
A plataforma esteve presente em uma série de festivais literários do Brasil: FLIP – Festa Literária Internacional de Paraty; FLIPELÔ- Festa Literária Internacional do Pelourinho; FLIC – Feira Literária de Campina Grande; FLICA – Festa Literária Internacional de Cachoeira, FLIGÊ- Feira Literária de Mucugê, além de ter participado de atividades como o Fórum Social Mundial (2018); o Giro pela Vida – AVON (2019); e a Virada Sustentável Salvador (2019).
Neste ano, a iniciativa realizou oficinas de escrita, lançou o livro Performances do Tempo Espiralar, da poeta Leda Maria Martins e realizou a Conferência Insubmissão e Insurgência da Memória de Mulheres Negras no Brasil, além de fazer uma campanha de arrecadação de absorventes para distribuir a mulheres em situação de pobreza menstrual.
Fonte: Agência Brasil